Charlotte Joko Beck (EUA, 1917 ~ 2011):
Este pode ser um momento horrível — compreender que nada jamais irá satisfazer. Talvez tenhamos um bom emprego, um bom relacionamento ou família, e ainda assim estamos com sede — e torna-se claro para nós que nada realmente pode preencher nossas demandas. Podemos compreender que até mudar nossa vida — rearranjar os móveis — também não vai funcionar. Esse momento de desespero é na verdade uma bênção, o verdadeiro começo.[...] O desejo que exige ter satisfação é o problema. É como se nos sentíssemos constantemente com sede e, para extinguí-la, tentamos colocar uma mangueira em alguma torneira na parede da vida. Continuamos pensando que com essa ou aquela torneira, teremos a água que precisamos. Ao escutar meus alunos, todos parecem sedentos por algo. Podemos conseguir um pouco de água aqui e ali, mas isso apenas nos atormenta. Estar realmente sedento não é divertido. [...]Se estamos tentando por anos fixar nossa mangueira nessa ou naquela torneira, e cada vez descobrimos que não é suficiente, vai chegar um momento de profundo desencorajamento. Começamos a sentir que o problema não é falharmos em nos conectar com algo lá fora, mas que nada externo poderá jamais satisfazer a sede. É aqui que, bem provavelmente, começamos uma prática séria.
Uma coisa estranha acontece quando abrimos mão de todas nossas expectativas. Obtemos um vislumbre de uma outra torneira, uma que permanecia invisível. Conectamos nossa mangueira a ela e descobrimos, para nosso deleite, que a água está jorrando. Pensamos: “Agora peguei! Peguei!”. E o que acontece? De novo, a água seca. Trouxemos nossas exigências para dentro da própria prática, e de novo estamos sedentos.
A prática precisa ser um processo de desapontamento sem fim. Temos que ver que tudo que demandamos (e até obtemos) eventualmente nos desaponta. Essa descoberta é nosso professor. [...] Eventualmente, ficamos suficientemente espertos para antecipar nosso próximo desapontamento, para saber que nosso próximo esforço para matar a sede também vai falhar. A promessa nunca é cumprida. Mesmo com uma prática longa, às vezes buscamos soluções falsas, mas ao perseguí-las, reconhecemos nossa futilidade muito mais rapidamente. Quando ocorre essa aceleração, nossa prática está dando frutos.